quinta-feira, 15 de dezembro de 2016

Walt Disney morreu há 50 anos


Passam hoje 50 anos sobre a morte de Walt Disney.

Aqui recordamos alguns aspectos da vida e obra do conhecido realizador de cinema de animação, cujas personagens passaram à banda desenhada, transcrevendo um conjunto de artigos publicados pelo jornal brasileiro “Folha de S. Paulo” que lhe dedicou vários artigos na sua edição de 4 de Dezembro de 2001, quando se comemorou o centenário de Disney.

Esses artigos não esquecem os aspectos mais controversos de Disney:
 

"Para Ler o Pato Donald" foi um dos maiores ataques ao império Disney
 Por ALCINO LEITE NETO

Se o século 20 foi americano, ele também foi o século de Walter Elias Disney. O aumento progressivo do poder dos EUA sobre o mundo caminhou par a par com a influência que o criador de Mickey exerceu sobre o

imaginário de gerações e gerações.

Amanhã, faz cem anos que Disney nasceu. A cultura de massa e a indústria de entretenimento americanas lhe devem quase tudo. Ele fixou a forma moderna e o modelo industrial dos desenhos animados. Desenvolveu como nunca se tinha visto o marketing das histórias em quadrinhos.

Materializou a ficção em parques de divertimento construídos nos EUA e na França. Inventou um império econômico baseado na fantasia, que rende hoje cerca de US$ 20 bilhões por ano.

Contam que Stálin chorava ao ver "Bambi". Mas Disney foi, e ainda é, um dos personagens americanos mais odiados pela esquerda. Tanto por sua delação de esquerdistas em 1947, durante os processos da Comissão de Atividades Antiamericanas, quanto por colocar suas criações a serviço do "american way of life" e como propaganda da política dos EUA.

Um dos ataques mais fortes da esquerda ao império Disney foi feito pelo belga Armand Mattelart e o chileno Ariel Dorfman em "Para Ler o Pato Donald" (lançado no Brasil pela Paz e Terra). O livro foi escrito há exatamente 30 anos, no Chile, durante o governo do socialista Salvador Allende. Em 1973, um golpe liderado pelo general Augusto Pinochet depôs Allende. Mattelart e Dorfman se exilaram, o livro foi banido do Chile, mas se transformou em leitura obrigatória em vários países, inclusive o Brasil.

Mattelart e Dorfman examinavam como os personagens de Disney reproduziam a lógica capitalista, onde o dinheiro e a acumulação tinham papel predominante nas relações "interpessoais" entre os personagens, e como as histórias promoviam o imperialismo americano, ao caracterizar os povos estrangeiros como atrasados, tribalizados, ingênuos e/ou espertalhões. "O livro era um panfleto. Mas a relação de dominação no mundo, entre centro e periferia, tal como a examinamos, permanece válida", diz Mattelart, 65, na entrevista abaixo, feita em Paris, onde ele vive.

Dorfman é hoje um famoso escritor e dramaturgo, autor de "A Morte e a Donzela" (Paz e Terra), e "Terapia" (Objetiva), entre outros. Mattelart tornou-se um prestigiado teórico de comunicação.

Estudou as novelas brasileiras em "O Carnaval das Imagens" (com Michele

Mattelart, ed. Brasiliense) e dedicou-se a examinar os laços entre a comunicação e o processo de mundialização econômica, em livros como "Comunicação-Mundo" (Vozes) e "A Globalização da Comunicação" (Edusc). Em janeiro, estará lançando no Brasil, pela Sulina, "A História da Utopia Planetária".

Folha - Fazem 30 anos que o sr. publicou "Para Ler o Pato Donald". O que ainda é válido no livro e o que precisaria ser revisto?

Armand Mattelart - "Para Ler o Pato Donald" é um livro de circunstância. Era um panfleto, que escrevemos em condições muito particulares no Chile, ou seja, quando já havia três anos da Unidade Popular, o regime de Salvador Allende. Paralelamente à pesquisa de outros modelos de cultura de massas, de revistas para crianças, jovens e mulheres, nós elaboramos uma crítica dessa forma de expressão.

Pois bem, apesar disso, eu creio que há uma coisa que ainda é válida no livro, que é o capítulo que fala sobre subdesenvolvidos e o bom selvagem. Ele mostra como os patos saem da metrópole e chegam em países que se chamam, por exemplo, Aztecland. São lugares que se pode identificar [no caso, o México", mesmo se se trata de ficção. E, nestes países, os personagens estabelecem sempre uma relação de dominação.

Justifica-se o roubo das riquezas porque o bom selvagem não sabe o valor das coisas. A relação de dominação no mundo, entre centro e periferia, tal como a examinamos no livro, permanece válida.

Folha - O sr. acha que nada mudou nestas relações desde os 70?

Mattelart - Elas evoluíram, digamos. O mundo hoje é multipolar. Mas o que vemos em um período de guerra como agora? O problema hoje não é que a relação de dominação tenha mudado, mas que os Estados Unidos sejam, como nas palavras de Bill Clinton, a superpotência solitária. O que é surpreendente é que haja uma história de violência, na Ásia ou na América Latina, desde a década de 60, e que os americanos não tenham se tocado que a sua ação e intervenção produzem danos a milhões de pessoas. Foi preciso um ataque ao país para eles se perguntarem: por que nos odeiam tanto?

Folha - O sr. acredita que os americanos continuam tendo uma visão fantasiosa dos povos estrangeiros, como nas histórias em quadrinhos de Disney?

Mattelart - Provavelmente, como grandes ingênuos. E hoje eles reagem também como ingênuos, nesta espécie de roteiro de faroeste que é a cruzada contra o jihad. Eles continuam não se dando conta que há um conjunto de povos que foi explorado e que continua a sê-lo por um modelo de crescimento mundial que deixa à margem 80% da população mundial. O que não quer dizer, evidentemente, que se possa estar de acordo com esse tipo de atentado que tirou a vida de mais de 5.000 pessoas em Nova York.

Folha - Mas os personagens de Disney não se tornaram ingênuos, se forem comparados aos novos personagens infantis, mais violentos, ou aos videogames?

Mattelart - Sim. Creio que são personagens que foram muito marcados pela história, mas o problema não está aí. O que importa é que o seu universo se tornou um signo de reconhecimento mundial, no plano do imaginário infantil. Disney é o primeiro produto transnacional para crianças. Os personagens parecem ingênuos, hoje, mas isso não impede de ver o tipo de divertimento que eles representam. Para muitas crianças, é um imaginário que se naturalizou, em nível maciço.

Folha - A que o sr. atribui a longevidade dos personagens de Disney?

Mattelart - Digamos que eles se revificam e se revitalizam a cada vez em outros suportes, como nos filmes e nos parques. Em Paris, a Eurodisney costuma ter quase o dobro de visitantes que a Torre Eiffel e o Museu do Louvre.

Folha - O fascínio exercido pela cultura de massas é um fato ideológico, psicológico ou religioso?

Mattelart - Os três ao mesmo tempo. Quando escrevemos "Para Ler o Pato Donald", eram os produtos americanos que faziam os laços entre os diferentes países, sobretudo na América Latina. Nos domingos à tarde, sempre havia uma programação americana, de Disney inclusive. O que houve, contudo, foi uma "alfabetização" do imaginário, como dizem os publicitários. Hoje, tudo isso mudou. No Brasil, por exemplo, existe uma forte programação nacional. E já entramos em outra fase. O que se prepara agora é a mercantilização da educação. As universidades são mais e mais solicitadas pelas empresas. Se se deixa as universidades se privatizarem progressivamente, é evidente que se chegará também aos poucos à alienação da educação.

“ Desenhistas da Disney permaneceram anônimos “

por DIEGO ASSIS

Walt Disney pode ser o pai da idéia, mas, não fossem nomes como Ub Iwerks, Carl Barks, Paul Murry, Floyd Gottfredson, entre dezenas de outros -dos quais muito provavelmente você jamais ouviu falar-, nada disso teria saído, ou melhor, ficado no papel.

Embora existam muitas versões lendárias para a criação do camundongo mais famoso do império de Disney, entre elas a de que Walt teria se inspirado em um antigo "companheiro de quarto" de seus dias em uma espelunca de Kansas City, a mais realista delas conta que os primeiros esboços de Mickey Mouse teriam sido realizados por um americano de ascendência holandesa chamado Ubbe Iwerks.
 
Ub, como foi apelidado por Disney, já vinha dividindo com ele os créditos pela criação do coelho Oswald, uma das primeiras tentativas da dupla com animações.

Depois de ser passado para trás em um contrato nebuloso com a Universal Pictures, em 1927, Disney perdeu os direitos sobre Oswald e resolveu se concentrar mais na parte criativa e administrativa de seu estúdio, enquanto Iwerks e uma dezena de outros desenhistas tratavam de colocar mãos à obra e preparar "Piloto" ("Plane Crazy"), o primeiro dos curtas animados de Mickey.
 

No início da década de 30, Disney perderia seu braço direito. Iwerks  deixou Mickey para apostar em suas próprias criações.

Nessa época, Mickey fazia sua estréia nas tiras de jornal. Eram desenhadas por Floyd Gottfredson, responsável por dar vida a personagens como Pateta, Horácio e a vaca Clarabela.

Também o Pato Donald, que teve estréia animada em 1934, não foi propriamente criação de Disney. É de Carl Barks a responsabilidade por animações e tiras do personagem até 1966 e por dar a Donald a namorada Margarida, os sobrinhos Zezinho, Huguinho e Luizinho e Tio Patinhas.
 


 

A popularização dos personagens de Disney ao redor do mundo fez com que centenas de outros artistas juntassem-se ao time de responsáveis para dar sequência às aventuras da turma do Mickey. Da próxima vez que vir um desenho "de Disney", tente se lembrar disso.

 

“Biografia mostra Walt Disney como dedo-duro e informante do FBI”

 Por  SÉRGIO DÁVILA

Quando a Academia de Ciências Cinematográficas de Hollywood, o lar do Oscar, abrir amanhã a sessão em homenagem ao centenário de nascimento de Walt Disney (1901-1966), que acontece neste 5 de dezembro, apenas uma faceta de um homem polêmico será lembrada.

A do criador do Mickey Mouse, o personagem infantil mais conhecido do mundo, que revolucionou o cinema de animação com o longa "Branca de Neve e os Sete Anões" (1937) e montou um império do entretenimento que perdura até o dia de hoje. Os números não mentem: além de inaugurar um dos primeiros parques temáticos do mundo, a Disneylândia, WD produziu 497 curtas, 21 longas de animação e 56 longas (que renderam 29 Oscars), mais 330 horas do "Clube do Mickey", 78 episódios de "Zorro" e outros programas.

Mas é o outro lado de "Papai Walt Disney" que parece encantar as platéias cada vez mais. O do filho bastardo nascido de uma espanhola. O do menino que vestia as roupas e maquiagens da mãe e viraria mais tarde alcoólatra. O de racista, reacionário, informante secreto do FBI, simpatizante do nazismo e dedo-duro dos colegas no macarthismo.

 

Está tudo lá, na biografia cuja versão em "paperback" chega às lojas dos EUA em janeiro. É "Disney's World - A Biography" (O Mundo de Disney - Uma Biografia), do britânico Leonard Mosely. No aspecto ideológico, o livro avança muito pouco o que já estava em "Para Ler o Pato Donald", bíblia da esquerda latino-americana dos anos 70, escrita por Ariel Dorfman e Armand Mattelart.

E ignora completamente uma religião criada apenas para repudiar o império Disney. É a Igreja do Não-Consumo, fundada há alguns anos em Nova York pelo performático Bill Tallen. Semanalmente, ele encarna seu personagem mais famoso, Reverendo Billy, que sai à rua para protestar.

Billy grita contra o consumo desenfreado e inconsequente dos americanos, de preferência em frente à loja da Disney da Quinta Avenida.

Segundo a seita, cujo único mandamento é "Não comprarás", Mickey Mouse é o anticristo, e seu boneco lidera as passeatas pendurado de ponta-cabeça numa cruz.

"Disney também roubou nossa infância", disse Bill Talen/Reverendo Billy há alguns meses à Folha. "Não temos memória de quando aprendemos a andar, só sabemos como o Bambi aprendeu a andar e nos emocionamos, e essa memória afetiva foi vendida por uma multinacional."

"Branca de Neve"

Nem tudo são polêmicas nos cem anos de Disney, no entanto. Há algumas semanas, a empresa lançou nova versão em DVD e vídeo do clássico dos clássicos em animação, o conto de fadas "Branca de Neve e os Sete Anões", como já fez outras tantas vezes.

"São várias gerações se encantando com o desenho", diz o folheto promocional do estúdio. É verdade. Desde que existe o videocassete e, depois, o DVD, a Disney solta uma nova edição de "Branca", que fica por um curto período no mercado. Depois, todas as cópias são recolhidas.

A estratégia deu certo de novo. Vendeu 1 milhão de exemplares só no primeiro dia nos Estados Unidos -8 milhões de cópias até agora.

Assim, o desenho animado virou o segundo filme mais comprado em DVD e VHS no mundo, atrás só de "Titanic".

Tradição oral germânica recolhida pelos irmãos Grimm no começo do século 19, o conto de fadas foi a primeira animação de longa-metragem do cinema.

Começou a ser urdida em 1934 e estreou três anos mais tarde. Também nos últimos dias o estúdio lançou uma nova versão de "Dumbo", que faz 50 anos. Mas isso já é uma outra história...”

Cronologia da Vida de Disney

5 de dez.1901

Nasce, em Chicago (EUA), Walter Elias Disney filho de Elias e Flora Disney.

1916

Começa a frequentar os cursos de desenho da Academia de Artes de Chicago. No tempo livre, faz cartuns para o jornal da sua escola

1918

Aos 17 anos, inscreve-se como voluntário na Cruz Vermelha e torna-se motorista de ambulância, em Paris. Ao mesmo tempo, trabalha criando pôsteres para o Exército americano

1919

Consegue seu primeiro emprego como aprendiz de desenhista em um estúdio publicitário de Kansas City, onde conhece Ub Iwerks. Assiste no cinema aos primeiros desenhos do Gato Félix, de Pat Sullivan e Otto Messner

1920

Passa a trabalhar na Kansas City Film Ad Company, onde começa a aprender as primeiras técnicas de animação

1922

Juntamente com outros artistas produz seu primeiro filme de animação, "Chapéuzinho Vermelho" (Little Red Riding Hood). Funda, com o amigo e desenhista Ub Iwerks, a "Laugh-O-Grams Films"

1923

Muda-se para Los Angeles para tentar a vida como diretor de cinema. Produz uma série que misturava filme e desenhos batizada de "Alice na Terra do Desenho Animado" (Alice in Cartoonland). Com a ajuda de seu irmão Roy, funda a Disney Brothers Production, que mais tarde viria a se chamar The Walt Disney Studio. Casa-se com Lillian Bounde, colorista de seu estúdio

1926

Disney e Iwerks criam a série do coelho Oswald (Oswald, the Lucky Rabbit) a pedido da Universal Pictures. O trabalho duraria dois anos. Por ter cedido os direitos autorais do personagem à Universal, Disney foi despedido. Encerra seus trabalhos como desenhista propriamente
 

1928

Surge o Mickey Mouse. Desenhado por Ub Iwerks e dublado por Disney, o personagem estréia no curta animado e sem som "Piloto" (Plane Crazy). O primeiro desenho sonorizado foi "Mickey, o Navegador" (Steamboat Willie). A produção marca ainda a estréia de Minnie, a eterna namorada de Mickey
 


 

1930

Produz em Technicolor "Flowers and Trees", primeiro desenho com cores, da série "Sinfonias Tolas". O King Features Syndicate publica as primeiras tiras de Mickey, desenhadas por Floyd Gottfredson até 1975. Surgem novos personagens como Horácio, Ferdinando e a vaca Clarabela

1933

O personagem Pateta aparece pela primeira vez na revista "Mickey Mouse Magazine #1", que trazia textos e tiras do universo Disney

1934

O Pato Donald aparece em "A Galinha Sábia" (The Wise Little Hen). O sucesso do personagem se deveu principalmente ao trabalho do dublador Clarence Nash. Nesse mesmo ano, as primeiras tiras diárias de Mickey são publicadas no Brasil
 

1937

Depois de três anos de trabalho estréia "Branca de Neve e os Sete Anões" (Snow White and the Seven Dwarfs), primeiro longa-metragem animado da história. Pelo feito, Disney recebeu um oscar honorário da Academia

1940

Orçado em US$ 2 milhões, estréia "Fantasia", adaptação para Mickey de "Aprendiz de Feiticeiro", de Paul Dukas. O longa animado teve direção musical do maestro Leopold Stokówsky e contava com músicas de Bach, Dukas, Tchaicovsky, Stravinsky, Beethoven, Ponchelli, Schubert e Moussorgsky
 

1941

Walt Disney visita o Brasil, Chile, Argentina e Peru a pedido do governo americano. No Rio, conhece o cartunista J. Carlos, que serviria de inspiração para a criação de Zé Carioca

1943

Zé Carioca debuta em "Alô, Amigos" (Saludos Amigos), como o cicerone do Pato Donald em uma visita do personagem ao Rio de Janeiro. O filme foi responsável pela popularização de "Aquarela do Brasil" (Ari Barroso) e "Tico-tico no Fubá" (Zequinha de Abreu) no exterior

1945

Ainda usando o material de suas viagens ao Brasil, Disney lança "Você Já Foi à Bahia?" (The Three Caballeros), com participação de Zé Carioca, Panchito e Pato Donald

1947

Carl Barks cria Patinhas, o tio milionário do Pato Donald

1950

A Editora Abril publica a primeira revista do Pato Donald no Brasil. A revista trazia também as aventuras de Zé Carioca, que ganhou a companhia de personagens como Rosinha e Nestor

1953

Depois de vinte e cinco anos é produzida o último desenho animado da série de Mickey

1955

Estréia na TV americano de "Clube do Mickey", um dos programas infantis de maior sucesso da história da televisão

1966

Morre Walt Disney, por complicações de um câncer no pulmão, no dia 15 de dezembro

1983

O camundongo volta a protagonizar um longa em "O Natal de Mickey" (Mickey"s Christmas Carol)

1986

A personagem Margarida torna-se mais um título da Editora Abril. As histórias, publicadas somente no Brasil, surpreendem pelo tom "feminista" da namorada de Donald

1988

Mickey ressurge fazendo uma "ponta" em "Uma Cilada Para Roger Rabbit", de Robert Zemeckis

1995

"Runaway Brain", primeiro curta de Mickey em 42 anos é lançado

25 de ago.2000

O desenhista Carl Barks morre de câncer, aos 99 anos

 

segunda-feira, 5 de dezembro de 2016

Morreu Golib, um dos mais irreverentes e inovadores autores de Banda Desenhada


A notícia foi esta manhã divulgada em Portugal pela agência Lusa:

“O autor de banda desenhada francês Marcel Gotlib, criador do cão Gai-Luron, morreu hoje aos 82 anos, anunciou a editora Dargaud. "A família comunicou que Marcel Gotlib morreu hoje", na sua casa, na região parisiense, acrescentou a Dargaud, manifestando a sua "enorme tristeza".

“Marcel Gottlieb, conhecido como Gotlib, lançou o cão Gai-Luron na revista semanal Vaillant em 1962, e na revista Pilote, de René Goscinny, o criador de Astérix, criou a Rubrique à Brac, em 1968, uma série de banda desenhada excêntrica, de humor cáustico, de enorme êxito”.

Gotlib era uma dos mais criativos e irreverentes autores da BD franco-belga.

Nasceu em Paris em 14 de Julho de 1934, filho de refugiados judeus hungaros, e formou-se em desenho publicitário e, antes de se dedicar em defenitivo à BD, ilustrou vários livros para crianças entre 1960 e 1961, usando vários pseudónimos (Mar-Got, Garmo, Marclau).

A sua primeira BD foi uma adaptação de um romance da condessa de Ségur, “Le General Dourakine.

É a partir de 1962 que o seu horizonte se alarga com a sua entrada para a equipa da revista “Vaillant”, antepassada do “Pif Gadget”,  onde cria o cão Gai-Luron.



 
Em 1965 muda-se para a revista “Pilote”, mais de acordo com a sua irreverência criativa, onde colabora com argumentos de Goscinny e  Mandryka na elaboração de várias histórias curtas., as famosas “Dingodossiers”. Três anos depois cria “La Rubrique à brac”.

 
 
Naquela revista colabora com argumentista com vários autores como Alexis, Druillet ou Mandrika, entre muitos outros.


 
Em 1971 cria com Jacues Lob o famoso “SuperDupont”, e nesta década sai da revista “Pilote” , que então conhece alguma instabilidade, colaborando na revista “Rock e Folk” com a série Hamster Jovil e, um ano depois, em 1972, com Claire Bretécher e Nikita Mandryka, cria uma das mais irreverentes e revista de BD, a trimestral “L’Echo des savanes”, que se publicou até 1982, da qual acabará por sair em 1975 para fundar outros dos títulos marcantes da vanguarda da BD, a revista “Fluide Glacial”, que se continua a editar (aceder AQUI ao site oficial dessa revista).
 
A partir de 1980 dedica-se quase exclusivamente à redacção dos editorias da revista, publicando a sua última obra de originais em 1986, “La bataille navale ou Gai-Luron en slip”.

Consagrando-se a partir daí quase exclusivamente à publicidade e à reedição de obras suas, recebeu o Grande Prémio do Festival de Angoulême em 1991.

Em 2014, por ocasião do seu 80º aniversário, o Museu de Arte e História do Judaismo, em Paris, realizou uma grande exposição retrospectiva sobre a obra de Gotlib.








 

terça-feira, 29 de novembro de 2016

Recordando "Quim e Manecas", a famosa série de BD de Stuart de Carvlhais

Para quem não viu a reportagem da RTP 2 sobre a mais famosa série de BD portuguesa "Quim e Manecas", criada por Stuart Carvalhais, pode ler, clicando AQUI , a informação que o site da RTP disponibilizou sobre a famosa série criada em Janeiro de 1915.

segunda-feira, 21 de novembro de 2016

Aos 86 José Ruy prepara lançamento de novo album

Aos 86 anos, José Ruy está a terminar mais um álbum e tem vários prontos a sair (Foto Pedro Catarino/CM)
O jornal Correio da Manhã publicou hoje uma excelente reportagem sobre José Ruy, o autor de BD portuguesa com mais álbuns editados e que, aos 86 anos, se prepara para lançar uma nova obra, desta vez dedicada a um episódio da história açoriana.

Aqui transcrevemos essa reportagem da autoria de Vanessa Fidalgo:
 
"O mestre dos 'quadradinhos'

José Ruy é o ilustrador português com mais álbuns editados: 81. Mais de metade são de banda desenhada
Por Vanessa Fidalgo
in Correio da Manhã de 21 de Novembro de 2016

"Começou a desenhar "garatujas" com quatro ou cinco anos. Mas foi a primeira edição do mítico jornal de banda desenhada ‘O Mosquito’, que entrou em casa de José Ruy pelas mãos do pai, que fez nascer repentinamente "aquele fascínio pelo contar histórias aos quadradinhos". Corria o ano de 1936 e José Ruy, o ilustrador português com maior número de álbuns publicados (81) e um dos maiores da banda desenhada nacional, tinha então apenas cinco anos e estava longe de adivinhar que aquilo era o seu futuro.

"O mítico jornal de banda desenhada custava então 50 centavos e os cinco mil exemplares de tiragem, considerável para a altura, esgotaram-se rapidamente. Tal como os números seguintes, que no auge chegaram a vender 80 mil exemplares e que marcaram a memória de várias gerações de adeptos da BD. José Ruy incluía-se nesse naipe de seguidores, até que em 1945, com apenas 15 anos, ele próprio foi também desafiado a sentar-se nos estiradores de ‘O Mosquito’. "Era preciso um rapaz para dar cor" e o então jovem aluno da António Arroio não hesitou em sentar-se ao lado dos mestres António Cardoso Lopes Júnior (conhecido por ‘Tiotónio’) e Raul Correia.
"Lá se iam os planos paternos para que cursasse arquitetura! "O meu pai era da opinião de que o desenho e a pintura não davam nada. E efetivamente não dão. Mas dão muito gozo a quem tem o privilégio de poder fazer deles profissão", admite José Ruy, rodeado de esboços e recordações no seu ateliê na Amadora, cidade que o viu nascer (bem como a ‘Tiotónio’) e que, por causa deles, fez por se afirmar capital da BD. E com o início das colaborações para ‘O Mosquito’ e mais tarde para ‘O Papagaio’ veio uma mesada extra para comprar "melhor papel e tinta da china". Melhor do que aquela da marca nacional, a Cisne, "que era cinzenta e não tinha opacidade e era difícil de ser captada graficamente".

"Na António Arroio, onde foi discípulo do mestre Rodrigues Alves, especializou-se em Artes Gráficas, que viriam a providenciar-lhe durante décadas e décadas o sustento, ao mesmo tempo que em paralelo fazia banda desenhada para jornais e revistas. Quando era menino exercitava furiosamente o traço. "Fiz milhares de desenhos, de estudos, desde a anatomia dos animais ao movimento das ondas do mar. Depois das aulas, ia para o jardim zoológico e desenhava as feras. Cheguei a assistir ao parto de uma leoa e depois desenhei todo o processo de crescimento de uma das crias. Isso permitiu-me ganhar uma grande versatilidade e facilidade no desenho. Desenho tudo de uma forma muito rápida, sem grandes dúvidas ou hesitações. Quase nunca apago." Essa velocidade de produção ainda hoje, aos 86 anos, o acompanha. Continua a desenhar muitas horas por dia e, seguramente, muito mais do que aquilo que consegue editar.

"Também continua a sentir a urgência de acabar um desenho apertar-lhe o peito, tal como quando era criança. "Vou gerindo a vida conforme os desenhos. Se quero acabar um, almoço mais tarde. Eu então como primeiro, para depois poder dedicar-me só a ele", confessa. Geralmente, é a mulher que tem de lhe bater à porta do ateliê a lembrá-lo dessas coisas mundanas…

"Até porque o privilégio de se poder dedicar somente à banda desenhada só chegou muitos anos de trabalho depois nas artes gráficas.

"Foi mais ou menos em meados dos anos 80, quando a Editorial Notícias o desafiou a tempo inteiro." Quando começou a trabalhar para a ASA, passou então a trabalhar no seu ateliê a partir de casa, cujas paredes não deixam dúvidas quanto ao legado do homem que entre elas vive: estão forradas de homenagem, caricaturas, dedicatórias, carinho e admiração.

"NA ERA DO PC

"Nos últimos tempos, José Ruy conheceu, com os computadores, uma verdadeira revolução no seu trabalho. Primeiro, estranhou-os, mas depois rendeu-se a eles.

"Eu era contra os computadores porque eliminavam postos de trabalho. Na gráfica onde trabalho, por exemplo, a máquina de antes tinha quatro pessoas para trabalhar, hoje precisa apenas de uma porque os corpos são comandados por computador", começa por contar. Mas a filha lá o foi convencendo de que o PC iria permitir-lhe fazer "um trabalho mais limpo" e que, caso se enganasse, não teria de apagar tudo e começar do início. Perfecionista e rigoroso como é – assim o descrevem os pares –, a perspetiva de melhorar a qualidade do produto final convenceu-o: "Logo a mim, que até ainda continuava a usar uma máquina de escrever Hermes Baby, que era do meu pai. Mas a verdade é que, de cada vez que me engana, tinha de rasurar. Ou se caía um pingo de tinta a mais", recorda.

"Agora, José Ruy faz os esboços a carvão, passa os originais a tinta da china e depois digitaliza-os. "O computador permite-me ainda ampliar os desenhos e fazer retoques ou detetar imperfeições que nos escapam no papel e que na gráfica nunca corrigem, porque eles naturalmente têm medo de mexer no desenho", explica. Finalmente, chega a parte de colorir, que antes era feita a aguarela. José Ruy conseguiu dar a volta à tecnologia e formatá-la de modo a usar a sua "paleta própria" de cores.

"Por outro lado, como faço muitas sessões em escolas, também me facilitou a vida nas apresentações: antes levava as fases do meu trabalho em diapositivos, hoje levo tudo em PowerPoint." E os miúdos adoram. E brindam José Ruy com as mais inusitadas questões. "Um dos rapazitos, de nove anos talvez, pergunta-me a propósito dos ‘Lusíadas’ porque é que ainda não compreendia bem aquilo. Expliquei-lhe que era algo que ia passar conforme fosse crescendo."

"Sinais que os tempos não perdoam. José Ruy viveu muitos ao longo da sua carreira. Antes do 25 de Abril, por exemplo, tinha de ter muito cuidado. "Tínhamos a censura dentro dos jornais e o nosso objetivo era que as coisas não fossem cortadas. Portanto havia que ter cuidado. Lembro que uma vez, numa história do Fernão Mendes Pinto, pintei-o como um rapaz imberbe, quando o previsível seria que ao fim de tantos meses no mar tivesse uma longa barba. Só que isso fazia lembrar muito os piratas norte-americanos… e não podia ser!"

"Dos jornais de banda desenhada também já há muito que não há sinais. "Passou-se para o livro de BD, o que é mau para os autores. Nos jornais havia sempre os colaboradores de maior gabarito, os estrangeiros e, claro, os iniciados, como eu também comecei por ser. As pessoas compravam pelos grandes ou pelos que gostavam, mas ao mesmo tempo iam ficando a conhecer os novos. O livro já não é assim. Se não se gosta ou não se conhece, não se compra. Até porque é um investimento muito mais caro do que era um jornal", lamenta.

"SEMPRE A PRODUZIR

"Aos 86 anos, José Ruy não tem vontade de abrandar. Um dos seus mais recentes livros foi a biografia em BD de Carolina Beatriz Ângelo, lançada na última edição do festival de BD da Amadora, com o apoio do Conselho Regional do Sul da Ordem dos Médicos. Mas em abono da verdade, a história começou a nascer na ponta dos seus dedos há cinco anos, por sugestão da filha, Teresa Pinto, membro da Comissão pela Igualdade do Género.

"Estava-se perto do centenário da sufragista, cirurgiã e a primeira mulher a votar em Portugal. José Ruy investigou a sua vida para a poder fazer renascer nos quadradinhos, mas não se livrou da sina da própria Beatriz Ângelo. "O livro demorou cinco anos a ser publicado por falta de um apoio na distribuição."

"Mas projetos não lhe faltam. Tem prontos a sair um livro sobre a Ordem dos Templários, outro sobre as origens da cidade de Coimbra e está a terminar uma obra sobre a forma heroica como os habitantes da ilha do Corvo venceram os corsários com pedras de lava. Como usa sempre modelos vivos, viajou recentemente para a ilha, para poder transpor para o papel rostos de verdade.

"Será mais um álbum a juntar aos outros 81 já no início de 2017. Mais um para imortalizar o homem e o artista".